Ela estava à janela, nua. O vento
movia os seus cabelos com subtileza e ela contava os carros que passavam na
rua. O que vale um carro? Viu um Mercedes, seguido de um carro velho e por
último uma bicicleta. Em termos monetários é fácil de imaginar o que vale mais.
Mas cada veículo tem uma história, desponta sentimentos que podem mudar o seu
valor.
Foi então que ela percebeu que o
valor das coisas não é único. Pelo contrário, era subjectivo. Até o valor do
próprio dinheiro, que se pode contar facilmente, varia de pessoa para pessoa. E
então ela viu que este podia ser o maior problema do nosso mundo. A vida de um
panda não tem qualquer valor para muitos. As crianças esfomeadas não têm
qualquer valor para a maioria. Porque todos nós sabemos que elas existem, e que
morrem enquanto nós lemos este texto, mas na realidade não nos interessa. Não nos
interessa por várias razões, mas todas elas apontam para um grande, redondo e
abismal: EU. Porque a prioridade é a nossa vida, e essa é que tem valor. Valor para
mim claro, porque para a humanidade não tem valor nenhum. Porque para o mundo,
para o planeta terra, menor que um átomo quando comparado com o Universo sem
fim, a minha vida, a tua vida, não tem absolutamente valor nenhum.
A mulher inspirou o fumo do seu
cigarro e continuou a permitir que a sua mente prosseguisse a viagem. Se a tua
vida não tem valor, que dizer da tua roupa? Que dizer de todos os objectos que
te apoderas para pertencer a uma sociedade, quando na realidade a própria
sociedade em si nada vale? O seu valor absoluto: zero. E no entanto parece que
a nossa vida gira em torno deles. Ridículo. Uma vida que não vale nada gira em
torno de objectivos e pertences que nada valem. E as horas de trabalho gastas
para pagar tais privilégios? Não estaremos a desperdiçar quase uma vida
inteira? Ah, esqueçam, a própria vida não tem valor.
Neste momento a mulher parou. Olhou para si,
desconcertante, a pensar que tudo o que estava a ver era inútil. Tinha de se
agarrar a algo, algo que lhe dissesse que valia a pena ela existir. O interior.
Seria o seu interior, o teu interior, digno de valor? Seriam ao menos os
pensamentos dela úteis, valiosos?
Uma coisa é certa, há mentes que
são desprezíveis. Mas também é verdade que existem pessoas com pensamentos de
algum valor. Não perfeitas. Não bondosas. Não verdadeiras. Mas pessoas que
estão muito perto de ter valor, se tal é possível.
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