terça-feira, 3 de abril de 2012

Carinho é para quem merece...


E sinto, fujo e corro, pois não quero voltar. E dentro de mim ela morre, lentamente. O que era antes jamais voltará e rio do meu próprio funeral, deito uma flor em cima do caixão. Morro alegremente, pois não ficam saudades. Estico a mão porque não quero ficar lá, na terra. É a dor, a tentar sobreviver. Piso-a. Esborracho-a debaixo do meu salto alto e sorrio. Vais morrer, e com o teu fim, com as minhas dúvidas, com o teu decompor lento e fedorento vou deixar cair a pele e nascer. Serás um infeliz infortúnio que, contudo, será lembrado. Foste a base do aprender, os erros cometidos ou as boas ações incompreendidas. Não posso mostrar piedade para comigo mesma. A podridão é comida pelos vermes. E ficas tu, apenas tu. E grito agora. Não de dor, não de prazer. Choro e grito porque estou a nascer. E cada dia que passa o rebentar é mais forte, e aprendo a falar, a comer, a andar… a amar. O cérebro é irrigado com força e vontade. 

Vou ao cemitério fazer-me uma visita. Colho uma flor e olho para a minha própria campa. Obrigada. Sem a tua morte não teria nascido e sem o teu pecado e bondade não teria aprendido. A bondade é algo que deve ser cuidadosamente tratada. A caridade é o ponto fraco do ser humano. São características como estas que nos fazem vacilar perante a sociedade. Ser bom é hoje em dia um defeito. Mais vale enterrar a bondade delicadamente, guardá-la debaixo de terra e apenas exumá-la numa ocasião muito especial. As pessoas que a merecem devem ser preservadas junto com ela, enterradas também para que as possamos proteger e não sofram. O carinho que tantas vezes sentimos e que nunca chega a sair das nossas bocas é um elemento poderoso. Devemos enterra-lo para que não desapareça. Apenas viverá no nosso olhar até à velhice. Porque são pessoas que nos tocam, que são importantes, que sentimos ser únicas. Então guardamos esse sentimento na esperança de que talvez um dia elas compreendam que realmente são marcantes para nós. Aquela que foi mais amada, essa guardaremos bem ao nosso lado, no adormecer e ao acordar, até morrer. Literalmente.