domingo, 31 de julho de 2011

Campeonato Nacional de Escrita Criativa - 2ª jornada

Um erro informático faz com que cerca de 400 pessoas ficam presas num pequeno departamento de uma empresa. Só há uma pequena máquina de snack e bebida.

Ser único é ser o melhor, o pior ou simplesmente diferente. Ou então é ser contemplado com algo, estupidez ou raciocínio, talento ou um objecto. Ser único nem sempre é bom.
Que o diga a velha máquina de snack e bebida que descansava ao fundo do corredor de um departamento, quando quatrocentos pares de olhos se lhe dirigiram em uníssono. Sim, era a única.
As portas de aço eléctricas continuavam dramaticamente encerradas. Os elevadores tinham há muito desistido da luta inglória que durava há mais de dezoito horas. Afinal, sem a vital energia eléctrica, de que valia a sua existência?
A culpa, esse sentimento que todos procuram manter num sítio distante e inatingível, estava personificada num vírus. Um vírus virtual, duvido que uma vacina resulte. Já o sentimento, inicialmente de surpresa e adrenalina, deu lugar ao pânico quando funcionários e centenas de crianças se aperceberam que não era um jogo. Sendo esta uma das melhores empresas de bolachas a nível nacional, era comum receberem visitas de estudo. Mostravam não só a confecção dos biscoitos, como o local onde tudo é decidido. Agora estavam todos impedidos de sair dali.
Os seus rostos porém, inicialmente gulosos, ficaram lentamente em choque. Posteriormente veio a fome. “Primeiro as crianças” – São as regras de sobrevivência de um ser justo e sensível como o humano. E tem toda a razão, Senhora Professora. Pena é que os seus pequenos olhos cor de azeitona se perdessem no mar de cabeças inquietas. Mas quais?!
A sua força de onze anos, juntamente com o sentimento inato de egoísmo, levou a um banho de sangue. A pobre máquina gemeu, sentindo os seus vidros estilhaçarem-se em segundos. Seguiram-se estes, gritando de dor por penetrarem na carne inofensiva, sentindo o calor do sangue. As crianças, essas, ainda tentavam perceber qual a origem de todo aquele líquido encarnado.
Os refrigerantes foram ingeridos sofregamente. Os snacks devorados na sua maioria por um funcionário barrigudo, que coçava agora o bigode. Tinha toda a razão, estava habituado a mais alimento que aqueles pequenos indivíduos.
As necessidades, não as habituais materiais entenda-se, encontravam-se a um canto. O cheiro do desespero era misturado com o odor animalesco. O som seco de pancadas nas portas foi substituído pela música dos telemóveis. Pais em pânico, tentando acalmar os filhos.
Um clic... Um Segurança. Um grupo de criaturas agora livres, que de humano nada tinham. Porque antes de sermos pessoas, somos animais.

sábado, 23 de julho de 2011

Campeonato Nacional de Escrita Criativa - 1ª jornada

Desafio da semana:

Pense num produto sem o qual não poderia viver. Agora imagine que a marca anunciou que o vai tirar, em breve, do mercado. Escreva para a empresa a tentar demovê-los dessa decisão.

Ainda tenho esperança que acorde e que isto não passe de um pesadelo. É o fim. Apesar de a escrita não ser de todo o meu forte, não podia deixar de vos escrever uma carta, esta carta.
Todos nos apontam para a insignificância da vida sem amor. Lutamos pela liberdade das nossas escolhas e olhamos para o sexo oposto com ousadia e travessura, fazendo uma expressão puramente brejeira e gulosa. Mas se o amor é belo, como iremos praticá-lo agora?! A vida assim não faz sentido.
Poderia ir à falência qualquer empresa, qualquer uma! Mas logo aquela que produz os preservativos mais seguros do mercado?! Imaginar um mundo em que não se pode ter prazer porque sim é simplesmente cruel… Poderiam acabar os telemóveis, os saldos, até o petróleo! Preferia andar a pé do que deixar de sentir os corpos suados e escorregadios, deslizando um no outro… Mas não sentindo temor! Pânico! Pânico é o que vai emergir após o doce e salgado prazer, carinhosa ou simplesmente bruta satisfação. Cada qual é que sabe do que gosta.
 Já o clímax…Tão doloroso que é agora pensar nesse momento de pura loucura: audível entre os gemidos e perceptível a cada contracção de deleite... Segundos singulares em que o mundo fica suspenso no tempo e a vontade carnal, essa fraqueza não humana, mas animal, sempre vence.
E aparecem descendentes, doenças e mais descendentes. Pecado, no fundo, isto é apenas pecado. Pecado não mortal, porque ainda se desconhece que o delírio libidinoso mate. Já a crise, essa assassina que chacinou a vossa empresa, pode destruir milhões e milhões de humanos com tal bárbaro acto.
A minha indignação não pode ser deslocada dentro desta folha de papel. As consequências desta falência muito menos. Resta-me implorar que alguma alma bondosa, em vez de ajudar os refugiados em África, socorra a vossa empresa.
E já agora, se esta será uma sentença de morte para os ilustres dos mortais, que dizer do fado cruel de nós, vulgarmente chamadas e comummente procuradas, prostitutas?!